Globalização

CONSCIÊNCIA MUNDIAL OU “Philadélphia”

PERSONAGENS:

CientistaHomem com jaleco branco. Por debaixo, terno e gravata.Representa a Vida cultural/espiritual da humanidade.
JuristaHomem com beca de juiz. Representa a Vida Jurídica/política.
TrabalhadorHomem com macacão de trabalhador. Representa a Vida Econômica.
Consciência Mundial ou “Philadélphia”Mulher com véu, cobrindo todo o corpo. Representa os ecos do futuro da humanidade.
ArlequimHomem fantasiado de palhaço. Representa o zombeteiro, o farsante, o cínico. Deseja que tudo fique como está.

1O ATO: Cenário: ruínas e cidades bombardeadas. Uma mesa com quatro cadeiras no centro do palco, com um único foco de luz em cima. Quatro senhores exaltados e discutindo alto. Depois o senhor da cartola listrada de azul e vermelho se aproxima:

Distinto público,e sta é a reunião de Bretton Woods, realizada no ano de 1944. Somos os países vencedores da IIª Guerra Mundial (Gestos de prepotência e de grandiosidade). Dois projetos estão em discussão: o plano White, o nosso, e o plano Keynes, o do britânico (Gesto depreciativo). Mas quem vence, todos vocês sabem. Afinal, os britânicos sempre foram os colonizadores, mas agora chegou a nossa vez! Agora chegou a nossa vez! (Voz alta). Vamos criar um fundo monetário internacional, o FMI. Por causa dele, todos terão que recorrer a nós. Afinal quem não quer dinheiro? Quem quer dinheiirooo? Mas tem um preço: os juros de empréstimo. O principal não me interessa. O que me interessa são os juros, os altos juros! (Gargalhada).

(Nesse instante, entram bailarinas, dançarinos e arlequim. Música, mais música,…e muita diversão. Fecha-se o pano).

(Entra em cena, com a cortina fechada atrás de si, a “consciência mundial” ou Philadélphia):

O que se realizou aqui foi a perpetuação das antigas distorções presentes no mercantilismo e no imperialismo, com nova roupagem: o neoliberalismo, de mãos dadas com o FMI. Assim os “países poderosos” e o “grande capital” podem emprestar dinheiro aos países pobres e usufruir o “retorno” através dos altíssimos juros de empréstimos.

(Sai de cena).

2O ATO: Cenário: laboratório, com computadores, livros, papéis, ossadas. O cientista.

Sou o representante da espécie humana. Vim dos confins da Lemúria, passei pela Atlântida, pela Índia, pela Pérsia, pelo Egito, etc. e cá estou no cimo deste promontório, que bem me serve de pedestal. Conquistei tudo o que queria. Domino céus, terras e mares (Gestos grandiosos). Tenho a melhor casa, o melhor serviço, a melhor esposa, “a melhor amante” (Sussurando), o carro do ano, sou imitado pelos outros, pratico o esporte mais radical, destruo quem se interpõe à minha frente, etc. etc. etc. (Dá uma volta no palco, gesticulando)… No entanto por que estou triste? Por que o meu coração não se cala e aceita passivamente o que a minha cabeça dita? Por que os meus membros tremem? Essa vida não me interessa mais. Acho que vou dar um fim em tudo que criei.

(Luz vermelha, tambores… Depois música celestial – coro das crianças, do final do Io ato da ópera Parsifal de Wagner). Pára e reflete. Troca de luz no centro: verde. Foco de luz clara no canto direito: Entra a “consciência mundial” ou Philadélphia, com a mão esquerda para cima e a direita para baixo e para frente:

Ó homem, ouve-me! Chegaste a esse ponto para conquistares a ti mesmo como ser humano. Livre, totalmente livre de tudo, inclusive de teus criadores. Só que esqueceste da tua condição mais nobre e te transportaste somente para o viver em sociedade e para o atuar no mundo. A escola e a ciência, que deveriam ser as representantes da vida cultural/espiritual, estão viciadas pelo tecnicismo operante e enxergam o homem apenas como máquina. Vive-se numa massa amorfa, manipulada pela mídia, a favor dos interesses dos poderosos. Com o meu poder que vem do futuro, trago a sabedoria necessária para compreenderes o que se deve fazer. É preciso que, doravante, desenvolvas o individualismo ético, para que, em liberdade, possas caminhar para o mundo, para desenvolveres a moralidade. Tanto na alma humana como no organismo social, existem as mesmas partes e em número igual. Quais são essas partes? No corpo têm-se a cabeça, o tronco e os membros. Na alma têm-se o pensar, o sentir e o atuar. Na cabeça vige a liberdade do pensar. No tronco, com o coração e o pulmão, age o rítmo do sentimento. Os membros, por serem potencialmente livres, se deixam permear pelo pensar e atuam no mundo com moralidade. Assim se tem também, no mundo, o organismo social, com a vida econômica, que representa a cabeça, com suas leis claras e precisas no comércio; a vida jurídica/política, que representa o tronco, na procura do equilíbrio social; e a vida cultural/espiritual atua no mundo com liberdade e deveria alimentar os outros dois membros do organismo social.

(Fecha-se o pano).

30 ATO: Cenário: cidade, campos, fábricas, escolas. Muita iluminação. O cientista entra feliz e tira o jaleco. Paletó e gravata por debaixo.

Prezados amigos, é preciso restituir a globalidade que está faltando no organismo social. A Educação e a Cultura devem ser os instrumentos de elevação humana, através da conquista da virtude, o que se pode denominar de individualismo ético. Mas não se pode ficar centrado em si mesmo: é preciso que o ser humano se realize no mundo como ser moralmente produtivo. Para isso, a vida cultural/espiritual deve criar Bancos sociais, no sentido de que o dinheiro cumpra o seu papel individual, social e econômico. Os seus recursos, ou capital, poderão vir da vida produtiva, desde que os industriais considerem essa medida mais humana e ecológica, numa nova ordem social. O “Banco social” deverá visar a “circulação do dinheiro”, no sentido de fomentar o capital de empréstimo e de doação, para aqueles que necessitam de meios para trabalhar economicamente no mundo, ou para a cultura.

As propostas de Keynes não foram perdidas, ficaram aqui dentro do meu “coração”, para serem aplicadas no momento certo e de modo correto, dentro de uma visão global de organismo social. Por isso não podiam ser realizadas naquele tempo. Vamos recordar o que propunha o Banco de Compensação Internacional ou International Clearing Union? Esse banco internacional visava realizar o equilíbrio no balanço de pagamentos das nações participantes. Dispensava seus membros de qualquer depósito de moeda, pois criava uma nova moeda internacional, de natureza escritural, que ele denominou de Bancor, ou poderia ser modernamente Globus?, a ser creditada, como doação, nas contas dos Bancos Centrais dos países participantes, em cotas diferentes, segundo o volume de comércio exterior de cada um. Aplicava um tributo sobre os países credores e devedores, sendo que o dos primeiros seria uma espécie de “juro negativo”, a fim de compeli-los a utilizar seus Bancors ou Globus, na compra de produtos das nações devedoras, tornando assim compulsória a participação dos credores no ajuste do equilíbrio mundial. Com essa idéia inovadora, verdadeiramente de globalização, poder-se-ia colocar o juro dentro de parâmetros razoáveis. Poder-se-ia resgatar a dignidade humana e valorizar o indivíduo produtivo economicamente. No entanto isso só terá valor se essas idéias frutificarem dentro de uma visão global de organismo social trimembrado, como está sendo abordado aqui.

(Entra o jurista):

A vida jurídico/política, após receber os conteúdos da vida cultura/espiritual, através da “Philadélphia”, conscientiza-se de seu papel “social”. Por isso pensa em entregar à iniciativa privada as estatais, seus bens e propriedades. Inclusive o Banco do povo deve ser entregue a quem lida com a “circulação do dinheiro”, pois o Estado não tem essa função. Com relação à Terra, é preciso se chegar a novos conceitos, pois, nas “eras rudes da sociedade”, ela não pertencia a ninguém. O monarca, ou senhor do feudo, apenas arrendava do rei. Quando as terras passaram para mãos privadas, estas exigiram uma renda, mesmo por esse produto natural. Justamente o rendimento elevado da terra provoca um aumento do preço dos produtos. Enquanto permanecer o crédito real, para a terra, sem se cultivar nada, deixando-a em seu estado original, como nos grande latifúndios, se estará apenas elevando o preço da terra. Esse capital acumulado, especulativo, artificial, é altamente danoso para a economia, porque a natureza não pode ser ligada ao capital, mas ao trabalho. Pela própria condição da natureza, as terras não podem aumentar de valor, se não se aplicar um trabalho nelas. A terra, por sua própria condição natural, não tem valor. É o trabalho que deve ser considerado como elemento de elevação do valor e não a terra em si. Por isso, o crédito, o capital, deve ser direcionado para quem quer trabalhar e não para a terra. É preciso que o setor jurídico trace as normas legais na nova estruturação do organismo social, no sentido de que a terra não seja possuída nem pelo Estado nem pelo indivíduo. Ela poderá apenas ser colocada à disposição para uso, através de uma Carta de Direito da Terra, a ser elaborada pela Justiça. Inclusive, com esta proposta, deverá ser estabelecida a nova política agrária, pois não mais existirão os “sem terras”. Todos terão uma terra.

(Entra o trabalhador – os outros dois permanecem):

Companheiros, o homem tem como meta “atuar no mundo com moralidade”. Nesse sentido, a produção tem a ver com: os bens de capital, a força do trabalho e a terra. Os bens de capital constituem a capacidade do espírito humano, que se condensa numa máquina, numa fábrica. Essas podem produzir bens para serem consumidos, mas elas mesmas não podem ser consumidas. Para isso, sempre se utiliza alguma matéria-prima que vem da “terra” e, através do “trabalho”, esses bens entram em “movimento”, na circulação comercial. Para se realizar algo no mundo, necessita-se de crédito pessoal. Esse aspecto implicará na estruturação da Vida Cultural/espiritual no mundo, para que esta crie os Bancos sociais. Com relação à Terra, os senhores da terra, os latifundiários, como todos os outros homens, gostam de colher onde nunca araram. Ela poderá apenas ser colocada à disposição para uso, através de uma Carta de Direito da Terra, a ser elaborada pela Justiça, como foi comentado pelo companheiro da vida jurídica. Sobre a questão salarial, “pagar pelo trabalho” vem do tempo em que ainda existiam escravos, quando o ser humano era vendido como mercadoria. Essa visão distorcida ocorre justamente por faltarem as questões básicas na troca de valores: trabalho versus salário. Assim se estabelece uma falsa noção do chamado vínculo empregatício. O “mercado de escravos” transformou-se em “mercado de trabalho”. Esse é um dos motivos de o “egoísmo” do patrão usurpar o trabalho alheio. Em contrapartida, o trabalhador se transforma em um auto-sustentador. Ou seja, ele trabalha para si, egoisticamente para o seu salário. Como se sabe, pela “divisão de trabalho”, ninguém trabalha para si, mas se trabalha para os outros, para as necessidades dos outros. O trabalho também não é mercadoria, e não será o número de horas trabalhadas que resultará no salário correspondente. Como fica isso? A questão salarial precisa ser melhor esclarecida, através de outro enfoque: Para começar uma empresa, o industrial ou o pioneiro, precisará de “capital” para iniciar o empreendimento, “solicitar terras”, maquinários, pagar os juros do “empréstimo”, etc. O restante do que entra é o valor proporcionado por todos os que trabalham naquele serviço. Denomina-se valor agregado, ou seja, “valor” que pode ser repartido entre todos os que participam desse crescimento empresarial. Portanto o salário constitui a participação no “valor agregado” da empresa. Por isso o salário não é “despesa” e nem corresponde ao “preço do trabalho”. Aliás, o que é vendido não é o trabalho, mas sim o “produto” do trabalho. Por isso a palavra certa para “salário” é remuneração e isso traduz o “valor do trabalho” e não o seu preço. O produto do trabalho, no fundo, pertence ao trabalhador. Nesse caso, toca-se num problema crítico, que é a relação de trabalho. Ou seja, não se troca o trabalho por qualquer outra coisa, pois não existe um valor que possa definir o “trabalho” de outro elemento. Em verdade, o que ocorre é uma troca de valores. O trabalhador produz algo e o empresário apenas lhe compra o produto final. Portanto é o empresário quem compra os produtos do trabalhador e, com seu espírito empreendedor empresarial, consegue usufruir o lucro na circulação da mercadoria, através do preço. Portanto, o preço tem a ver com a mercadoria e deve ser procurado entre os comerciantes, aqueles que compram e vendem. Desse modo, nas relações de trabalho, ocorre uma verdadeira compra. Por isso a “relação empregatícia” deve ser baseada em novos elementos de “troca”, entre os dois interessados: o empregador e o empregado. Ambos têm um objetivo comum, o de crescimento da empresa. Ou seja, ambos disputam a distribuição de rendimentos, o valor agregado.

Companheiros, economia é isso. Economia tem a ver com “produção, circulação e consumo de bens materiais para satisfazer as necessidades humanas”. No fundo, significa a “realização do homem no mundo”. A mercadoria é colocada em um fluxo globalizado, mundial, para ser consumida. Por isso não se justifica a criação de mercados regionais, como Mercosul, Alca, Mercado Europeu,etc. Também não se justificam as cooperativas capitalistas, os sindicatos corporativistas, as câmaras de diretores logistas, etc. É preciso que os três interessados, na vida econômica, o produtor, o comerciante e o consumidor, ou seus representantes, se reúnam em Associações Econômicas, no sentido de traçar as verdadeiras metas econômicas. Só assim se poderá controlar o preço, valorizar o trabalho humano e atender aos interesses do consumidor!

(Diminui a iluminação e cai um foco de luz no canto canto direito. Entra “Philadélphia” – mão esquerda para cima e a direita para baixo e para frente):

Essa é a “meta” de uma civilização mais humanizada a ser assumida pelos povos do mundo inteiro. Um mundo globalizado. Uma terra para todos. Deverá ser almejada a partir de hoje, mesmo que seja “mentalmente”, para ser realizada amanhã!

(Entra arlequim, do outro lado, com foco de luz vermelha – ambos ficam no proscênio, tendo ao centro os representantes da trimembração do organismo social):

(Rindo) Isso tudo é besteira. Prá que mexer nisso tudo? Se satisfaço a todos com abastança, prazer, divertimento, mídia, TV,… O resto que se estrupie. (Saltitando e repetindo:) Eu transformo tudo em “pizza”, eu transformo tudo em “pizza” (Gargalhada).

(Fecha-se o pano. Fim).

Dr. Antonio Marques

(Peça baseada em Platão, Aristóteles, Goethe, Steiner,
Fernandes, Smith, Budd, Vogel e Hermannstorfer)

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